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sábado, 2 de fevereiro de 2013

Santa Maria: a quem cabe a culpa?  Ou a responsabilidade?

Os proprietários da boate Kiss estão detidos. Porque são culpados? Ou responsáveis? Ou ambas as coisas? A investigação está em andamento, e poderá apurar que extintores não funcionaram, que foi usado material pirotécnico indevido, que o isolamento usado é altamente inflamável e tóxico, que havia superlotação, que foram retiradas as câmeras  com seus registros, que o alvará havia caducado, que o mesmo foi concedido sem que o local estivesse de acordo com as normas da legislação, que mesmo estando dentro da Lei, o senso comum condena as instalações do ponto de vista da segurança, que os bombeiros tardaram demais em fazer a vistoria, etc., etc.

Mas, e agora? Suponhamos que estivesse tudo errado, mas rigorosamente dentro da Lei. Porque o texto das leis é impreciso, dá margem a interpretações diversas. De quem é a culpa? E a responsabilidade? Culpa pressupõe falta voluntária a uma obrigação ou a um princípio ético. Responsábilidade implica em  dar lugar ou motivo para algo acontecer. Se o local requeria uma saída de emergência e não a tinha, e a lei não obrigava a tanto, parece-me que, se o senso comum aconselha a tê-la, cabe a responsabilidade a quem redigiu e revisou e aprovou a lei: os legisladores.  Mas eles não têm culpa, legalmente, porque não tinham a obrigação de requerer a tal saída de emergência. Digamos que foram levianos não avaliando corretamente os riscos decorrentes da falta da mesma. Responsáveis pela sua irresponsabilidade.

E os proprietários, são culpados? Faltaram voluntariamente com alguma obrigação, como ter extintores devidamente em dia, permitir o uso do material pirotécnico, tolerar o excesso de pessoas, uma superlotação? São culpados por contrariar o senso comum e não investir em uma saída de emergência, mesmo que a lei assim não o determinasse? E a quem cabia controlar os extintores? Aos bombeiros? À fiscalização da Prefeitura? Ou os proprietários são responsáveis, por permitir essas irregularidades? Ou foram apenas levianos por não avaliarem acertadamente o perigo de uma tragédia? Lembro o caso do delegado que deixou o filho dentro de seu carro, fechado, o que lhe causou a morte. Culpado? Responsável? Ele era responsável pelo filho. O esqueceu no veículo. Em que momento e sob qual circunstância a responsablilidade se transforma em culpa, aos olhos da Justiça? Nesse caso, ele foi inocentado por entender-se que, mesmo não sendo legalmente culpado, assim se sentiu, causando-lhe este sentimento de culpa um alto dano psíquico, um sofrimento forte, reconhecido pela Justiça como atenuante.

E os proprietários da boate, como se sentirão? Culpados? Um deles parece que tentou o suicídio. Certamente houve dano psíquico, tortura, sentimento de culpabilidade, depressão. Como haverão de sentir-se sendo responsáveis por tantas mortes, de jovens tal qual eles, muitos conhecidos, amigos, companheiros? Estão em um inferno astral, similar ao do  delegado. E presos. Detidos por mais 30 dias, com futuro incerto. E os integrantes da banda, principalmente aquele que acionou o artefato fatal?

E o governo municipal? E o governo estadual, responsável pelos bombeiros? E os bombeiros, que parece tardaram para fazer a requerida vistoria, por alegadas questões administrativas? E os fiscais da Prefeitura? E os vereadores, por acaso não teriam o dever de estar a par das condições precárias de esse assim como de outros estabelecimentos? E as companhias de seguros?

Complicado. Culpados? Responsáveis? Houve uma corrente de  erros que começaram lá encima, no Congresso Nacional, aquele que elabora e vota as leis.  E no microcosmo de Santa Maria, os proprietários, o último elo,  carregarão para sempre  a dor,  o estigma, o sentimento de culpabilidade, o ônus moral e social, além das perdas pecuniárias. Todos responsáveis, ninguém pode ser inocentado,  mas parece-me que, ante o universo de actores deste trágico acontecimento, não cabem penas restritivas da liberdade.

E aos pais, familiares, amigos das vítimas fatais, cabe, além do sofrimento, do estupor, a justa revolta, a inconformidade, mas não a vingança. Sim a difícil aceitação, a solidariedade, a  certeza e o frágil consolo de que serão tomadas (já o estão sendo) medidas para evitar que esta tragédia que ecoou pelo mundo como um grito de alerta, volte a repetir-se. Triste. Muito triste.
Que Deus acolha aos que se foram, e reconforte aos  que ficaram, sobreviventes e familiares.